DEUS FALOU COMIGO
Eu estava angustiado por um mal de saúde, lento em minhas vontades adiando tudo e rumando ao descaminho da procrastinação e carregando a cabeça de recordações do que deveria ter feito e renunciando a qualquer pensamento que exaltasse o que fizera em minha vida até aquele momento.
Num sábado à tarde, como habitualmente fazia sai caminhar no bairro e ao passar em frente à igreja entrei. Sem saber direito os rituais, me dirigi a um dos bancos e fiz, como pude ou sabia o sinal da cruz e acomodei-me. Logo ouvi uma voz intensa, nada assim tonitruante, era algo suave, porém estranha o suficiente para assustar-me e pensar em “síndrome de pânico” ou um desarranjo mental, considerando o que a voz me falou:
– Marconi, esta semana você vai morrer!
Alarmado, num sobressalto sai da igreja. Voltei cabisbaixo para casa e passei uma noite de aflição. Uma óbvia agonia que se dissipou logo após o despertar do dia seguinte, quando não sei exatamente porque, tirei de minhas ideias a amargura trocando-a pela alienação completa do ocorrido substituindo-a por uma dissimulada coragem recheada de bons pensamentos.
Esses bons pensamentos são aqueles sobre desejos não realizados. “Aforismos” não estavam sendo suficiente então achei que atitudes se fariam necessárias e tive a ideia de fazer somente o que gostava. Deixei longe meus trabalhos e procurei meus sonhos.
Com Lápis, papéis, tintas e pincéis inspiração, muita inspiração me pus a desenhar e pintar. Recolhendo palavras que me rodeavam escrevi, frases, textos, poesias. Tudo de bom e mau gosto que sempre tive vontade de fazer. Passei a semana assim, feliz entre meus loucos e bons desejos.
No sábado seguinte fui direto a igreja. Daquele jeito desleixado me acomodei no mesmo banco onde ouvira a voz disposto a desafiá-la:
– Deus, você falou que eu morreria, pois estou aqui vivo e feliz…
– Feliz, certo, o velho Marconi morreu!