A hora do pão que para alguns nunca chega

Quarta-feira, nove horas da manhã, atravesso a rua para depositar uma sacola de lixo no contêiner e me deparo com um cidadão que puxa os resíduos de dentro da estrutura metálica, pega um pacote com restos de comida, desembrulha e sai comendo tranquilamente pela calçada. A sensação não é de nojo, diante de uma cena dessas o que impera é o sentimento de tristeza, de impotência diante das imperícias do sistema. A refeição nos desce goela abaixo de forma amarga e indigesta quando paramos para pensar nesse tipo de situação, a vida não é igual para todos, temos várias distorções que nos separam por imensos abismos de diferença. Obrigatoriamente, toda política pública deveria contemplar em seu alicerce de atuação o combate à fome. Será que não tem como a Prefeitura otimizar ainda mais os gastos e implantar um restaurante popular em parceria com a iniciativa privada? Eu acho que sim. Até porque se existe dinheiro para gastar com publicações institucionais em jornal-papel como nunca antes na história da cidade, deve haver capital financeiro para impedir que as pessoas adoeçam por conta da desnutrição. O falecido Guidugli já dizia que a saúde do povo é a comida, referia-se às necessidades do corpo humano, sábio como sempre foi.
O ideal seria termos ao menos três refeições diárias: café, almoço e janta. Algumas pessoas fazem apenas uma por dia, sem saber se terão algo para comer no dia seguinte. É muito fácil deixar de se preocupar com o próximo quando se tem a garantia segura da comida à mesa, é como se a miséria fosse algo surreal, um mero instrumento da ficção pessimista de pseudo intelectuais. A convenção de que os miseráveis são invisíveis é ilusória, só não vê quem não quer. Mas eles não têm voz, isso é fato. Alguns dos políticos que se elegem prometendo lutar pelos mais necessitados muitas vezes se voltam contra eles, passando a defender na prática os interesses de grupos setoriais que ao longo das décadas se acostumaram a viver do dinheiro público.
Enfim, comece a observar melhor essas pessoas que reviram o lixo fétido dos contêineres, boa parte dela está com fome enquanto o poder público se preocupa em usar espaços hoje desnecessários para dizer que está fazendo isso e aquilo, dando a entender que está tudo às mil maravilhas. Não está.

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